domingo, 24 de abril de 2011

Distanciamento

Lembro-me de quando era pequeno, de visitar a madrinha de minha irmã, que eu chamava de tia, e que morava na cidade vizinha. Entre a minha cidade e a cidade dela havia duas vilas. Naquela época, e até pouco tempo atrás, eu podia jurar que esses dois bairros se distanciavam em quilômetros um do outro. Eu ficava cansado só de imaginar em ir de uma ponta a outra desses dois conjuntos. Eu ficava cansado só acompanhar meus olhos irem de um ponto ao outro. Para mim, era tão longo o trajeto que, de dentro do ônibus, atravessar as duas vilas parecia uma longa viagem, um mar sem fim.
No entanto, hoje vejo e percebo que o trajeto não é tão longo assim. Até construíram uma ciclovia que liga os dois conjuntos habitacionais. E, com isso, chego a pensar como as distâncias estão desaparecendo, estão sumindo dos mapas. Não existem mais barreiras. Não existem mais divisas. Não existem mais cercas. Tanto a telefonia como a internet, e também toda e qualquer revolução tecnológica, provam o quanto estamos perto uns dos outros, o quanto oceanos e terras não separam ninguém. Contudo, neste momento tiro o chapéu aos grandes navegadores da história, que mostraram que o mar não é o limite, que o mar vai além da dor, ultrapassa o Bojador.
Ainda assim, depois de saber que estamos cada vez mais próximos, ao mesmo tempo estamos distantes uns dos outros, como nos grandes centros urbanos, nas metrópoles, onde somos capazes de viver cercados de pessoas e ainda nos sentir solitários, vazios; como o banhado sem águas e que não alaga; como uma fenda que não se fecha nunca, mas que luta e teima em se fechar, mesmo tendo tudo aos seus pés, às suas barras, às suas margens e em curtos espaços de tempo. Mesmo tendo Orkut, Facebook, Twitter, MSN etc.
Na altura dos meus quase trinta anos carregados em minhas costas, gravados em meus olhares e escorridos em meus cabelos, descubro que há algumas soluções caseiras para certas angústias. Entretanto, alimentamos outras angústias, e com isso desconheço a cura – ou o termo seria terapia, que está na moda? – para resolver problemas modernos, como o distanciamento que, ao passo que diminui, também aumenta entre nós e dentro de nós uma fenda, um buraco maior e mais vazio ainda, um banhado: a solidão, a distância sem medida – desmedida.




Adams Alpes
São José dos Campos, 2011.

micro-conto

A construção


Água. Areia. Cimento. Cal.
Baldes. Pincéis. Água. Cal.
Na casa, o caos.





Adams Alpes
Caçapava, 2011.